Lembranças do último fundador de Santópolis do Aguapeí


Inal Belo, que morreu em novembro do ano passado aos 94, havia concedido entrevista dois meses antes

12/05/2010 19:15 - Atualizado em 03/12/2021 19:27 | Por: Otávio Manhani

Otávio Manhani - Arquivo/Jornal Comunicativo

Inal Belo olhando para sua Carteira de Trabalho

No mês em que o município de Santópolis do Aguapeí (SP) completa 69 anos de fundação, o Comunicativo decidiu publicar uma entrevista exclusiva realizada com o último fundador da cidade, Inal Belo (1915-2009), em 17 de outubro do ano passado.

Dois meses depois de falar sobre o município que ajudou a fundar, Inal Belo morreu aos 94 anos, vítima de falência múltipla de órgãos após ter passado por uma cirurgia onde foi retirada parte de sua perna direita, decorrente de uma trombose, no dia 21 de novembro.

Mesmo com a memória um pouco falha, Inal Belo recordou da época em que foi junto com o amigo Antonio Francisco dos Santos Junior para a região onde hoje é Santópolis do Aguapeí. O terreno, adquirido pelo amigo em 1940, tinha uma área de 2.600 alqueires.

“Era tudo mata. Vim trabalhar em uma serraria. O Santos Junior veio pra cá e eu cheguei no outro dia. Ele que pagou minha viagem. Na época eu era solteiro, mas o senhor Santos era casado”, disse o último pioneiro, sentado em uma cadeira com almofadas na área dos fundos da casa, onde concedeu a entrevista.

Ao lado dos filhos Ricardo e Helena, que ajudavam o pai a lembrar alguns momentos, ele informou que no período de desbravamento, algumas famílias foram se instalando na fazenda, dando origem a uma vila chamada de Mil Alqueires.

“Fiquei instalado num alojamento que tinha três casas de madeira, junto com outras pessoas. A madeira da casa que ficamos veio de Piacatu (município vizinho a 12 km)”, explicou com sua voz rouca e baixa. Para provar a data de sua vinda, o último fundador mostrou sua carteira de trabalho, que data seu registro na serraria em 1º de dezembro de 1941. “Este foi meu primeiro emprego”, contou orgulhoso.

A rotina do último pioneiro de Santópolis do Aguapeí era bem tranquila. Acordava às 7h, tomava seu café da manhã e assistia um pouco de televisão. “Prefiro ver o jornal [na TV], ficar informado, né!”, completou.

No almoço, Inal Belo disse que não tem preferência por determinado tipo de comida. “Como de tudo um pouco”, relatou na ocasião. Após almoçar, fazia uma pausa para o descanso e depois ficava observando a movimentação na casa com a chegada e saída dos netos. Jantava e, por volta das 19h30, se deitava.

A história pessoal de Inal Belo muitas vezes se confundia com a história do município que ajudou a desbravar.

O nome ‘Santópolis do Aguapeí’ foi em homenagem ao fundador, cujo sobrenome é Santos, e Aguapeí é o nome do rio responsável por demarcar o limite territorial com alguns municípios vizinhos. O rio Aguapeí é popularmente conhecido como rio Feio.

A FAMÍLIA

Natural de Guaiçara (SP) e filho de um português com uma brasileira, Inal Belo é o segundo dos cinco filhos do casal, sendo ele o único homem. As irmãs já são falecidas.

Casou-se com Maria Rosa Alves da Costa no distrito de Maravilha (hoje Lauro Penteado, distrito de Clementina - há 10 quilômetros de Santópolis do Aguapeí). “Conheci ela aqui mesmo; dois anos depois que cheguei para trabalhar na serraria”, acrescentou.

Dessa união tiveram oito filhos, sendo quatro homens e quatro mulheres. Hoje já tem 19 netos e 13 bisnetos. Sua esposa morreu há dez anos, vítima de um câncer.

EDUCAÇÃO

Aposentado desde 1981, Inal Belo dizia-se orgulhoso por ter estudado seus oito filhos até o ensino fundamental com um salário mínimo da época. “Hoje um pai com um salário mínimo não consegue estudar sequer um filho”, comparou.

Durante a entrevista, ele afirmou que as escolas eram boas e os professores muito enérgicos. As salas de aula, segundo o pioneiro, havia entre 30 e 35 alunos. A primeira escola, com sete ou oito salas, ficava onde hoje está localizado o bairro dona Bila, próximo à rodovia estadual Assis Chateaubriand (SP-425), que na época também não existia. A instituição atendia em dois períodos.

Com relação à merenda escolar, Inal Belo comentou que eram os alunos quem levava. “Eu levava arroz, feijão. Aquilo que tinha em casa”, concluiu.